A prática da agricultura foi uma das mais importantes revoluções culturais realizada e vivenciada pela humanidade, que podem, enfim, passar da coleta para o plantio. A referida revolução só foi possível quando se percebeu, empiricamente, a germinação da semente em contato com o solo, observação que foi feita pela mulher, que passou a ser identificada como símbolo da fertilidade da terra.
Desde então, a agricultura familiar desenvolveu-se enquanto provedora de alimentos para o núcleo familiar e para o limite territorial no qual se insere, contemplando duas dimensões da divisão do trabalho: a reprodutiva – essencialmente feminina – e a produtiva – essencialmente masculina. Sendo a primeira voltada ao consumo e bem-estar familiar e a segunda à economia do mercado, economia esta concebida como “economia do excedente”, na qual aquilo que não fosse consumido na propriedade seria comercializado.
A partir de 1950, em virtude da Revolução Verde, a referida lógica de reprodução agrícola foi subvertida pela introdução da agroindústria e dos fetiches mercadológicos agregados pelo capital no ambiente rural. Nesse contexto, a dimensão produtiva dissocia-se e sobrepõe-se sobre a reprodutiva e o que era uma economia do mercado converte-se em “consumo de sobras” no contexto familiar. A inserção de máquinas e insumos agrícolas promove a desvalorização constante dos saberes locais de produção agrícola, além de supervalorizar o alimento vendido no mercado, em detrimento do produzido na propriedade. No referido cenário, o fazer social da mulher é progressivamente desvalorizado, ao passo que a sua dependência ao marido é substancialmente agravada.
Em 1960, diante das opressões causadas pela dominação capitalista no contexto rural, emergiram movimentos que propunham uma “agricultura alternativa” à moderna. Dentre os referidos movimentos, emerge, em 1970, a agroecologia, que reconhece a importância de se agregar os diferentes campos das ciências sociais, econômicas e ambientais em busca da valorização e fortalecimento da cultura tradicional, a fim de estabelecer renovadas formas de produção pautadas no equilíbrio e na sustentabilidade.
Nesse contexto de resgate sociocultural, a valorização dos espaços historicamente femininos, isto é, de reprodução agroecológica emerge como poderosa aliada no processo de transição de um contexto marcado pela exploração dos recursos naturais e dos trabalhadores rurais
Conclui-se, portanto, que a efetiva implantação de sistemas agroecológicos demanda o resgate da mulher enquanto provedora da vida e da sua relação direta com a prática agrícola.
Paula de Oliveira e Alaí Paixão
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