A troca de saberes na agricultura e na pecuária dos pequenos produtores rurais é um elemento de grande importância para o aperfeiçoamento da cidadania, na medida em que o conhecimento partilhado constrói sujeitos mais conscientes dos seus direitos e do papel social que possuem. Essa troca de saberes pode e deve se dar com a universidade pública que, dessa forma, reforça seu compromisso social e sua contribuição com o desenvolvimento de habilidades e técnicas cujos ganhos são para toda a sociedade.
Não se trata de uma imposição, mas de uma experiência dialógica, ou seja, uma verdadeiro diálogo de saberes populares e acadêmicos que amplia a formação de uma cultura política e democrática, a partir dessas exp
eriências para além dos muros muros da universidade. Hoje não faltam exemplos dos ganhos a partir dessas iniciativas a partir de posturas extensionistas.
É provável que o amigo leitor nunca tenha ouvido falar do termo extensionismo, ou extencionismo rural. Essa prática é uma das formas de se promover um diálogo permanente, uma verdadeira troca de saberes entre estudantes e técnicos com famílias de pequenos produtores rurais. Há uma constante troca de experiências, compartilhamento de técnicas, vivências, histórias e conhecimento, tendo como objetivo fortalecer a cidadania, a valorização da agricultura familiar baseada nos princípios da agroecologia.
O extensionismo rural, não deve de modo algum ser concebido como uma atividade em que só um técnico propõe mudanças e atua nesse sentido. Não é uma prática unilateral, mas uma forma de resistência social contrária às injustiças no meio rural. Constitui em essência um mecanismo de transformação da realidade por meio da escuta, do acolhimento e do diálogo que realmente promove associação da técnica com a cultura e as práticas comunitárias, se convertendo em ganhos para toda a sociedade.
Exemplos assim, podem ser constatados na Universidade Federal da Bahia, com base em grades curriculares, como as ACC e ACCS - Ação Curricular em COmunidade e em Sociedade.
No âmbito da UFBA, é possível citar a experiência da Feira Agroecológica, implantada pela primeira vez em 2016, fruto da disciplina “Comercializando a Produção Agroecológica” que ocorre sempre às sextas-feiras das 8h às 14h no campus de Ondina, coordenada pela professora Josanídia Santana Lima, do Instituto de Biologia. A disciplina contempla em seu aspecto mais amplo o que é essa troca de saberes, pois associa práticas estudantis em contato com a agricultura familiar e a agroecologia, em apoio aos produtores rurais, os quais comercializam os produtos orgânicos e artesanatos por eles produzidos em regime de agricultura familiar, debates e rodas de conversas sobre alimentação saudável e vários outros assuntos de interesse coletivo.
(Feira Agroecológica na Praça das Artes, Campus Ondina, UFBA)
Hoje, várias outras universidade públicas também possuem práticas extensionistas baseadas na lógica da troca de saberes. É o caso, por exemplo, das práticas educativas da Assessoria Técnica de Extensão Rural - ATER da Universidade Federal de Pernambuco (UFPB), que se baseia no auxílio e experiências com grupos familiares do Assentamento Rural Socorro, localizado na cidade de Areia-PB. O projeto visa promover a educação popular e a autonomia e empoderamento daquelas famílias rurais mediante a organização individual e coletivas.
Igualmente, práticas similares são também observadas nas atividades de extensionismo que evidencia a troca de saberes entre estudantes da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e pequenas famílias produtoras rurais da mesoregião do Oeste Catarinense que tem recebido suporte de como produzir a partir da agroecologia, mesmo com o rápido crescimento da mecanização do campo.
Mesmo diante desses exemplos, é preciso reconhecer que ainda há muito a se fazer quando o assunto é troca de saberes entre a universidade e a sociedade, principalmente, quanto parcela da sociedade, por vezes esquecida pelo poder público e políticas sociais de apoio e incentivo a uma produção agrícola familiar baseada nos princípios agroecológicos e de alimentos orgânicos. Necessário, portanto ampliar essas trocas de conhecimento popular com a universidade, ampliando o diálogo e promovendo a emancipação desses atores sociais.
A Necessidade de Valorização do Agricultor
Quem afinal, são esses agricultores familiares? São os pequenos produtores rurais, que têm o domínio de até 4 hectares de terra, produzem diversas culturas e a mão de obra predominante é do núcleo familiar. Diferente daquela imagem antiga de homem pobre do campo, esse pequeno produtor rural, hoje, é percebido como um portador de uma concepção diferente de agricultura, adverso à agricultura latifundiária e patronal dominante no Brasil.
Em contra partida, a agricultura familiar surge com práticas agrícolas totalmente diferentes desse agronegócio dominante, são elas: agricultura orgânica e agroecológica, somado com a atual prática agroflorestal, fundamentadas no princípio de conservação dos recursos ambientais, apesar de terem ideologias individuais. Ou seja, os responsáveis por nossa alimentação diária ser tão nutritiva, variada e segura, são os agricultores familiares, segundo dados da ONU, eles produzem cerca de 80% dos alimentos consumidos no planeta. Outro fator importante quando se trata de valorização da agricultura familiar, é o tamanho da empregabilidade de trabalhadores rurais que ela exerce nesse meio, ainda segundo dados da ONU, corresponde a 74% da mão de obra no campo. Logo, nota-se a necessidade real da valorização da agricultura familiar.
Espera-se muito do Governo e órgãos estatais para uma melhora, no sentido de alavancar esse tipo de produção sustentável e socioeconômico, de fato precisamos, com disponibilidade de créditos aos produtores, assistência técnica e estimulação dos mercados na recepção desses alimentos. Porém, ações individuais, como de formiguinha mesmo, são tão importantes quanto as governamentais, desde a preferência na hora da compra de hortaliças, verduras e frutas, o contato direto com o produtor e até o compartilhamento desse conhecimento, estimulando mais pessoas. Dessa forma, haverá incentivo para a produção e autonomia dos agricultores familiares, conservação e recuperação ambiental e elevação da qualidade de vida também nos centros urbanos.
As PANC e Seus Benefícios
A sigla PANC é designada na intenção de reduzir ou facilitar ao falar das Plantas Alimentícias não Convencionais. Durante muito tempo, essas plantas foram confundidas com ervas daninhas e deixadas de lado na alimentação dos brasileiros. Por sorte, o Brasil tem uma vasta diversidade dessas plantas altamente nutritivas, no entanto, a pergunta que não quer calar é, porque esses alimentos naturais e puramente benéficos são esquecidos por nós?
Muitas dessas hortaliças são consideradas exóticas, e julgadas pela sua aparência dita “não convidativa” - por serem folhas, talos, raízes -, a falta de informação sobre as propriedades dessas riquíssimas fontes de proteínas são motivos para o não consumo. No entanto, a busca por uma alimentação de qualidade contribuiu para o aumento da ingestão e propiciou o resgate da produção de diversas hortaliças que faziam parte do cardápio das famílias tradicionais - indígenas e africanos trazidos para o Brasil no período colonial - e foram esquecidas ou desvalorizadas durante o processo de identificação cultural, atual, dos brasileiros.
As PANC podem ser a salvação para o equilíbrio alimentar, pois se desenvolvem em ambientes naturais, sem a necessidade de muitos cuidados, sendo assim, fácil de serem cultivadas. Além disso possuem grande diversidade e são mais resistentes, então, não há necessidade alguma de usar agrotóxicos, e o melhor, por serem naturais, auxiliam na recuperação dos solos.
Diversos estudos científicos demonstram que as PANC são ricas em fibras, antioxidantes e proteínas, inclusive, com concentrações desses nutrientes superiores às verduras que estamos acostumados a consumir. É sabido que quando caímos na monotonia de consumir sempre os mesmos alimentos deixamos de ingerir a quantidade necessária de nutrientes essenciais para nosso corpo. Portanto, podemos concluir que a PANC é uma alternativa nutricional, contribui para uma alimentação de maior qualidade e variedade e também podemos levá-la para o mercado econômico, com a comercialização dessas hortaliças, atingindo um público interessado na alimentação saudável.
Mariana Dourado, Wellington Carneiro Guimarães e Yanna Maria
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